v. 1 n. 2 (2009): ESTUDOS DE ADMINISTRAÇÃO JUDICIÁRIA

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Assumindo Responsabilidade e Liderança
A história é conhecida. A analogia não. No dia 24 de abril de 1821, dois dias antes de voltar a Portugal, D. João VI chama o seu filho D. Pedro e lhe diz “Pedro, se o Brasil se separar, antes seja para ti, que me hás de respeitar, que para algum desses aventureiros”. Quase duzentos anos depois, o Poder Judiciário brasileiro enfrenta situação análoga à enfrentada por D. João VI.

Hoje como ontem, o Brasil passa por mobilizações que já pré-anunciam mudanças iminentes. Consensos se formam. Necessidades afloram. O rumo fica claro. O país aguarda. As vezes se impacienta. Antes, era a independência do Brasil de Portugal, hoje é a independência do Judiciário. Uma independência que precisa mais do que o formal reconhecimento constitucional. Precisa para se fortelecer que seja legítima. Legítima quer dizer reconhecida e sentida como agilidade e experiência pelos cidadãos.

A independência de hoje não dispensa a reforma da administração da justiça. Sem eficiência e eficácia a independência será apenas formal. Precisa-se de uma independência de pés encharcados de Brasil.

Diante da mudança eminente, da reforma do judiciário, que a sociedade demanda, o Judiciário, isto é o magistrado, e seus líderes, podem adotar duas estratégias excludentes. A primeira é negar a pré-eminência da reforma e agir como se ela não existisse. Ser contra. Resistir. A segunda é aceitar sua inevitabilidade, participar de seu processo. E liderá-lo.

Adotada a primeira estratégia, o poder Judiciário corre o risco de ser surpreendido como foi Napoleão quando planejava invadir e conquistar Portugal. Ao não participar das discussões com a sociedade ou ao discutir a reforma somente internamente, o Judiciário não produzirá eco social e o resultado não será partilhado pela sociedade. Não encontrarão o rei. Esta estratégia é autofágica.

Optando-se pela segunda estratégia, há o aumento não só da legitimidade do Judiciário, mas também o enriquecimento do próprio debate, que contará com a participação e experiência de um de seus atores mais importantes. Ganham todos, sociedade e magistrados.

Este foi o caminho escolhido pelos magistrados trabalhistas que aqui apresentam os seus trabalhos. Eles se debruçaram sobre os principais temas debatidos sobre a reforma da Justiça. Temas que enfrentam no exercício de suas profissões. Temas que vivenciam diariamente. São temas como modernização do Judiciário, planejamento estratégico, ética e responsabilidade social, administração da justiça, cursos de formação, relações do juiz com a sociedade. Temas já associados ao “novo Judiciário”.

Assim como D. João VI conseguiu perceber que a mudança já havia se iniciado e que não haveria volta atrás, e como bem apontaram Paulo Bonavides e Roberto Amaral, de tolo ele não tinha nada, esses magistrados, que aqui compartilham os seus estudos, também têm essa visão estratégica e de vanguarda. Só que diferentemente de D. João VI, não se afastam da mudança, a enfrentam. Não esperam que outros a façam. Tomam a iniciativa.

E ao enfrentarem os desafios e tomarem a iniciativa, mostram para a sociedade, e para os que tiverem o prazer de ler este Caderno, muito mais do que os seus posicionamentos. Eles compartilham os seus anseios e esperanças de um Judiciário mais próximo à sociedade e mais eficiente. Eles se expõem. E ao fazê-lo nos demonstram como o próprio Judiciário está preocupado e atento ao seu futuro.

Este segundo número do Caderno da Escola Judicial traz a coragem de seus autores em enfrentar as discussões sobre a Reforma do Judiciário. Reforma que ainda não está pronta, mas que já conseguiu mobilizar a sociedade e já entrou para a agenda do país.

A FGV Direito Rio desde seu início entendeu que a formação do magistrado era uma de suas tarefas e desafio. Um ensino jurídico preocupado com a justiça na sociedade não pode se restringir a formar apenas advogados. Há que formar juízes, futuros, seja no curso de graduação, seja nos de especialização, seja no pioneiro Mestrado Profissionalizante em Poder Judiciário, pioneiro em forma e em conteúdo. Por isto criamos um Centro de Justiça e Sociedade, voltado para a formação, produção de conhecimento, e mobilização política e social em favor da reforma do Judiciário.

Em favor de uma formação de magistrados que dialogam com economia, política, estatística, administração e demais áreas do saber. Magistrado confessional, parcial, na única parcialidade permitida. E até decisiva: a parcialidade em favor da democracia.

São pois dois os modos de ler este Caderno. Ler os textos, discuti-los, aceitá-los, ou não, complementá-los, criticá-los, aprendendo e apreendendo. Ou ler no segundo modo, como exercício, exemplo e responsabilização de mudança a partir da ação individual de cada um.

Através do Curso de Capacitação em Poder Judiciário, da FGV Direito Rio com o Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região tem o prazer em contribuir com esse debate trazendo a público as análises e indagações de seus alunos. E dessa forma contribuir para, digamos, um grito de independência e eficiência do próprio magistrado, por que responsável e respondendo aos melhores anseios do brasileiro, por mais ágil e melhor justiça.

Professor Joaquim Falcão
Fundação Getúlio Vargas – Direito Rio

 

Publicado: 2009-12-05

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